Vitamina B12 – Bases fisiológicas e efeitos na fisiologia humana

Elias Bacarin

Aluna da pós-graduação na Plenitude Educação

@nutrieliasbacarin

A vitamina B12 foi descoberta na década de 1920, através da pesquisa de Minot, Murphy e Whipple – na ocasião, os autores demonstraram que alguns sintomas da anemia perniciosa poderiam ser amenizados através da adição de fígado na alimentação. Posteriormente, o nutriente foi extraído de amostras de fígado e, por fim, a estrutura da vitamina foi de fato conhecida através do trabalho de Dorothy Hodgkin, onde a aplicação de cristalografia de raios-X foi realizada e descobriu-se uma estrutura que fora denominada de cobalamina até os dias atuais.

A cobalamina (B12) pode apresentar diferentes ligantes que determinarão sua nomenclatura específica, podendo ser eles a água (aquacobalamina), cianeto (cianocobalamina), hidroxil (hidroxicobalamina), metil (metilcobalamina) e S-deoxiadenosina (deoxiadenosilcobalamina). Quimicamente, o termo B12 engloba hidroxicobalamina e cianocobalamina, embora usualmente as outras formas químicas também sejam incluidas.

A importância da vitamina B12 está diretamente relacionada com o fato de, nas células, esta vitamina estar envolvida na reparação e na síntese de mielina, com o metabolismo de ácidos nucleicos e com a transferência de grupos metil, sendo a B12 um cofator para duas enzimas: a metionina sintase, que necessita da cobalamina na forma de metil, e a L-metilmalonil-CoA mutase, dependente de 5’-deoxiadenosilcobalamina (adenosil B12). Desta forma, a B12 se mostra essencial, por exemplo, para a formação e regeneração de eritrócitos e para o metabolismo energético.

Vista a relevância da vitamina B12 na fisiologia humana, estabeleceu-se uma ingestão diária recomendada baseada em manter os valores hematológicos normais e os níveis de B12 séricos dentro de concentrações consideradas adequadas: para adultos, atualmente, as recomendações de ingestão da vitamina são de 2,0/μg/dia e 2,4/μg/dia para o EAR (necessidade média estimada) e para o RDA (ingestão dietética recomendada), respectivamente.

A definição de deficiência de vitamina B12 varia de acordo com o ensaio utilizado, mas incluem cobalamina sérica <148pmol/l (200ng/l) na presença de sinais e sintomas e/ou índices hematológicos de deficiência de B12 ou cobalamina sérica <148pmol/l em conjunto com níveis séricos elevados de homocisteína ou ácido metilmalônico (MMA).

Baixos níveis de vitamina B12 podem ter manifestações clínicas à nível hematológico (aumento do volume corpuscular médio, hemoglobina reduzida, neutropenia e trombocitopenia), neurológico (neuropatia periférica, degeneração combinada subaguda) e neuropsiquiátrico (doença de Alzheimer, delírio, psicose, depressão e mania). As causas de sua deficiência, por sua vez, podem ter relação com baixo consumo da vitamina (vegetarianismo, alcoolismo crônico e indivíduos de maior idade), presença de doenças autoimunes (anemia perniciosa e síndrome de Sjögren), má absorção de cobalamina via dieta (gastrite atrófica, gastrite crônica e gastrite relacionada à Helicobacter Pylori), cirurgias (pós-gastrectomia ou ressecção ileal), má absorção (supercrescimento bacteriano no intestino delgado, insuficiência pancreática exócrina crônica, doença de Crohn, doença celíaca e acloridria), genética (deficiência de transcobalamina II) e uso de drogas (metformina, inibidores de bomba de prótons e antagonistas de receptores H²).

Observada a importância fisiológica da manutenção de níveis adequados de vitamina B12, diversos estudos analisaram os impactos que níveis fora da homeostase poderiam trazer à saúde humana – bem como melhorias vistas através da manutenção de níveis séricos adequados de B12. A seguir, os principais tópicos relacionados aos níveis de vitamina B12 e suas interrelações com a saúde humana serão destrinchados.

Vitamina B12 e sistema nervoso central

A S-adenosil-metionina (SAM) faz parte do metabolismo da homocisteína, que por sua vez tem relação direta com os níveis de vitamina B12: em caso de deficiência desta vitamina, as concentrações de SAM são reduzidas de forma proporcional. A SAM é a maior doadora de grupamentos metil presente no corpo humano e, portanto, é essencial para a síntese de poliaminas e para reações de transmetilação – necessária no processo de síntese e manutenção de mielina (estrutura que recobre axônios e facilita comunicação entre neurônios). Além disso, a síntese de colina depende de forma indireta da vitamina B12: a síntese de novo deste neurotransmissor (que tem ligação com a memória e a atividade do sistema nervoso simpático) tem inicio na descarboxilação da serina para formação da etanolamina, por reação dependente da vitamina B6; na sequência, este componente é metilado e, assim, estas etapas se tornam dependentes da metilcobalamina e de folato para a síntese de metionina. Neste sentido, a falta de vitamina B12 vêm sendo relacionada com problemas de mielinização e de neurotransmissão, podendo acarretar em encefalopatia e mielopatia.

Vitamina B12 e defeitos do tubo neural (DTN)

Os defeitos do tubo neural (DTN) incluem espinha bífida, anencefalia e encefalocele. A etiologia de DTNs não é totalmente compreendida, mas os fatores de risco incluem a deficiência de folato, fatores genéticos e também ambientais; no entanto, quando a fortificação de alimentos com folato foi realizada, os níveis de DTN reduziram – mas não foram totalmente zerados. Pensando nisto, outras pesquisas foram realizadas, e descobriu-se uma relação entre baixos níveis de B12 e um potencial risco para DTN, uma vez que esta vitamina atua como cofator para metionina sintase no ciclo do folato – se a oferta da B12 é baixa, o folato necessário para síntese de DNA poderia ficar ‘’preso’’ no ciclo de metilação, prejudicando a replicação celular. Como resultado, alguns trabalhos demonstraram consistentemente um aumento de 2-4x no risco de DTN com níveis baixos de vitamina B12 plasmáticos.

Vitamina B12 e cognição

Ainda que seja uma área de estudos em progressão e poucas evidências conclusivas sobre o assunto estejam disponíveis, discute-se o papel da vitamina B12 e sua suposta interferência em aspectos cognitivos. O ácido metilmalônico (MMA) é um indicador reconhecido dos status de vitamina B12 numa relação inversamente proporcional (altos níveis de MMA sugerem baixos níveis de B12), e os mesmos altos níveis de MMA também foram recentemente relacionados à declínio cognitivo e doença de Alzheimer (DA). Em 2012, uma revisão sistemática avaliou uma série de trabalhos e concluiu que a deficiência de vitamina B12 poderia estar associada à comprometimentos cognitivos – no entanto, não se sabe se a falta de vitamina B12 é um causador dos problemas ou um possível agravante na progressão deste comprometimento. Numa vertente mais voltada para o uso complementar via suplementos, a suplementação de vitamina B12 não se provou eficaz para a melhoria de aspectos relacionados à cognição em indivíduos idosos, numa revisão publicada no ano de 2021, que analisou 16 outros estudos. Cabe a ressalva, porém, de que os resultados encontrados nesta revisão foram mistos – com algumas evidências encontrando benefícios em aspectos cognitivos com o uso de vitamina B12. Mais estudos são necessários visando averiguar a relação entre a suplementação de vitamina B12 e a melhoria de aspectos cognitivos – especialmente trabalhos que perdurem por um período de longo prazo (>2 anos), uma vez que tais evidências ainda são escassas na literatura atual.

Vitamina B12 e doenças cardiovasculares (DCV)

Riscos para DCV incluem hipercolesterolemia, hipertensão e obesidade. Concentrações elevadas de homocisteína também parecem ter relação com maiores riscos de DCV – ainda que não esteja bem estabelecido se estas elevações são modificáveis ou um marcador independente no processo da doença. Alguns estudos demonstraram associações consistentes entre níveis de homocisteína e um aumento do risco de DCV – a suplementação de B12 com doses entre 0,02-1mg/d resultou numa redução de aproximadamente 7% nos níveis de homocisteína, enquanto o folato reduziu o risco em 10-30%. Alguns trabalhos investigaram os efeitos da suplementação de vitaminas do complexo B (incluindo vitamina B12) em conjunto com o folato (não sendo possível ‘’isolar’’ a magnitude de efeito da B12) e não encontraram reduções expressivas no risco de DCV. No entanto, as diferentes dosagens de vitamina B12 entre os estudos foram motivo de discussão entre alguns grupos, que colocaram este fator como possível limitante para a falta de resultados na redução do risco de DCV. Uma análise de um subgrupo descobriu que concentrações mais baixas nos níveis de vitamina B12 basal tiveram piores resultados para acidente vascular cerebral, morte e doença coronariana. Em indivíduos com níveis adequados de folato, a vitamina B12 se demonstrou um dos principais determinantes para modificações nas concentrações de homocisteína e, assim, ainda que mais estudos sejam necessários visando avaliar o real impacto dos níveis de vitamina B12 em DCV, seus níveis devem ser acompanhados regularmente visando a manutenção dos níveis basais dessa vitamina através da suplementação e/ou de ajustes dietéticos de forma pragmática.

Deficiência nos níveis de vitamina B12 são relativamente comuns nos dias atuais, mas baixos níveis séricos desta vitamina são investigados há quase 100 anos. O intuito do artigo acima foi destrinchar possíveis causas pelas quais deficiências nos níveis de vitamina B12 podem ser encontrados no corpo humano, bem como citar efeitos colaterais que a deficiência de B12 pode gerar. A adequação desta vitamina é fundamental – seja ela através de ajustes dietéticos e/ou de suplementação – e um profissional da saúde deve ser consultado visando avaliar individualmente o caso e tomar as decisões clínicas mais assertivas baseadas nas particularidades de cada um.

Quer saber mais sobre o assunto? Acesse:

Artigo 1

Artigo 2

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